
“Amo
como ama o amor. Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Que
queres que te diga, além de que te amo, se o que quero dizer-te é que te amo?”
(Fernando
Pessoa)
Ela
quis partir. Não foi embora de nada do que tinham de precioso, pois ela não
queria chorar a ausência das bagagens. Não carregou nos lábios densos e
sedentos a hora inevitável do outro beijo, que era o primeiro, feito anseio
pelo segundo, desespero pelo terceiro, vertigem pelo vale povoado de beijos
ciumentos, disputando sempre a preferência. Um beijo sepultou o outro e
desmemoriado com ela partiu. Ela não queria perder e para isso não teve.
Podemos achar o amor por ele oferecido, embrulhado em rara seda, em uma das
calçadas do tempo, pisado pela dolorosa oração: “Ah, se nós tivéssemos nos
conhecido em outro momento da minha vida.” Não sei dela. Partiu. Dele sei que
calou. Anda correndo por um túnel de silêncio. O silêncio costuma testemunhar o
enterro de dores e o combate dos desejos.
Julio Urrutiaga Almada In Caderno de Ontem - Ed. do Autor 2016
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