“Amo como ama o amor. Não conheço nenhuma
outra razão para amar senão amar. Que queres que te diga, além de que te amo,
se o que quero dizer-te é que te amo?”
(Fernando Pessoa)
Ela quis partir. Não foi embora de
nada do que tinham de precioso, pois ela não queria chorar a ausência das
bagagens. Não carregou nos lábios densos e sedentos a hora inevitável do outro
beijo, que era o primeiro, feito anseio pelo segundo, desespero pelo terceiro,
vertigem pelo vale povoado de beijos ciumentos, disputando sempre a
preferência. Um beijo sepultou o outro e desmemoriado com ela partiu. Ela não
queria perder e para isso não teve. Podemos achar o amor por ele oferecido,
embrulhado em rara seda, em uma das calçadas do tempo, pisado pela dolorosa
oração: “Ah, se nós tivéssemos nos conhecido em outro momento da minha vida.”
Não sei dela. Partiu. Dele sei que calou. Anda correndo por um túnel de
silêncio. O silêncio costuma testemunhar o enterro de dores e o combate dos
desejos.
Julio Urrutiaga Almada
Esta é uma das 90 narrativas constantes do livro Caderno de Ontem
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